30 e poucos
Trinta e poucos mas ainda com coração quase infantil. Adolescente, seria melhor. Com desejos dos dezoito e questões ainda anteriores. Alimento-me delas, na verdade, a cada dia de trabalho, em que me lembro como fui e o que me tornei. Ou ainda: em que fantasio o que fui e me equivoco quanto ao que me tornei. Porque tanta gente atravessa meus dias, e eu nem sei o que falar para quem espera algo de mim. Espera mesmo?Ou isso faz parte dos meus delírios de auto-importância que acabarão por me arruinar? Não importa, talvez.
Importa que tenho andado cansada, com vontade de trabalhar cada vez menos e tornar-me cada vez mais alguém que não sou. Uma louca que chute as portas e os móveis e se arraste delirante e apaixonada. Não a mulher responsável : a menina que nunca fui. Porque, afinal, sei que me perdi em um lugar que não sei mais qual foi, e virei isto que me angustia, porque tenho medo - de decisões, de desamparos, de morte, de tempestades. E não há o que fazer, neste feriado do Corpo de Cristo que agora termina, em que gatos desapareceram e os gritos pela rua nem sempre resultaram inúteis.