14 aulas
Assim: 14 aulas no dia. E sabe o que é mais estranho? Eu gosto.
Porque me alegra ver a cara deles e lembrar-me de mim mesma.
Porque gosto de contrair o estômago e sentir minha voz mais alta do que é.
Porque gosto de ouvir os murmúrios ao fundo, as risadas descontroladas.
Porque gosto de rir das coisas inócuas.
Porque gosto das diferenças todas. E da profunda semelhança entre nós.
Porque quando estou ali, sinto que há uma bolha em minha volta, e que posso ser leve.
E não me sinto menor, como em outras situações.
Porque em minhas veias há sangue, e o sinto pulsar enquanto as palavras se mostram.
Porque há beleza em ver as coisas todas se formando. E idéias que se desenham tão lindas.
Ontem a menina respondeu a uma questão na aula, daquelas que a gente faz por retórica, assim: "Ah, o início de Memórias Póstumas de Brás Cubas é um excelente exemplo de metalinguagem. Um clássico". E aquilo me foi uma mão apertando o peito, porque quando a conheci ela era uma menininha de 14 anos , ainda vacilante. Leu Memórias Póstumas comigo, na sala, no ano passado. Ao ouvir minhas palavras, que agora eram dela, tão justamente colocadas, tão adequadas, pensei que parte daquilo havia vindo de mim. Pois às vezes me esqueço do peso, e me coloco num lugar estranho de não ser. Mas ali eu era. Apenas. E uma aluna que sabia que aquele começo era um clássico. Ela saberia isso, algum dia, de qualquer forma. Mas o soube através de mim.
Gosto de ser um instrumento. Quisera ser aquele de que fala São Francisco de Assis: um instrumento que leve o bom onde só há o ruim. Ainda vou ser. Minha guerra pessoal.
2 Comentários:
Que lugar interessante. Eu achei. Acho que Clarice também acharia... um beijo
e e' disso tudo que eu sinto falta.
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